REVOLUÇÕES II –
Continuando meus comentários anteriores, com uma ligeira variação. É que vou comentar sobre um acontecimento que afetou Natal de forma inusitada e que a transformou de uma pequena cidade Nordestina tipicamente provinciana em uma cidade cosmopolita, “pra frente”, como se diz atualmente. Tudo isso deveu-se a II Guerra Mundial que, embora não tendo o Brasil como um país participante desde seu início, a influenciaria de maneira definitiva. Natal foi, sem dúvida, a cidade brasileira mais influenciada por essa guerra.
Fácil de explicar. A partir da segunda metade de 1941 passou a ser “invadida” pelos americanos, que instalaram aqui uma base aérea, das maiores da II Guerra. Tudo isso deveu-se a posição estratégia de Natal. Ponto mais perto da África, nesse momento da fase mais aguda da guerra, serviu de apoio as tropas aliadas que lá combatiam.
Num tempo em que o alcance de voo dos aviões era muito limitado, a única forma viável de sair das América, no caso, do Brasil, para chegar à África e Europa, era por Natal. Já antes da guerra, isso era evidente pelo número de aviões que aqui chegavam vindos da Europa, tornando-se a cidade consolidada como ponto de apoio a todos esses voos e sendo base da Condor, alemã, da Latecoere/Air France e das Linhas italianas/Alitalia.
A posição do Brasil na Segunda Guerra era, no mínimo, dúbia. Getúlio e alguns dos seus ministros, tinham uma velada propensão em favor da Alemanha. Só a truculência alemã, atacando nossos navios, e a realidade da nossa localização, nos encaminhou para apoio aos Aliados. E aí entramos nós, em Natal, como ponto avançado nessa luta.
Os americanos começaram a chegar por aqui no segundo semestre de 1941. Em pouco tempo, construíram aqui a maior base aérea fora dos Estados Unidos. No auge da guerra da África, o movimento do aeroporto era de quatrocentos ou mais pousos e decolagens por dia. O tamanho da base era tão grande que tinham sua própria estação de rádio, um jornal, cinemas (na base e em residências em Natal), três USOs (clubes de entretenimento), dois em Natal e um em Parnamirim. Aqui vieram grandes orquestras e artista americanos, se apresentando nesses clubes.
Tive oportunidade, embora ainda menino de onze anos, de vivenciar essa experiência. Meu pai tinha uma empresa de construções que fez muitos dos alojamentos da base. Como eu já trabalhava com ele (ajudando a preparar a folha de pagamento dos operários; se trabalhava 24 horas por dia) tinha amplo acesso à base e suas dependências, inclusive ao PX, uma espécie de supermercado, super sortido e com preços subsidiados, onde tomei minha primeira Coca Cola (havia uma fábrica na base) e comi o meu primeiro hambúrguer. Comprei roupas, alimentos, tudo que era novidade para Natal.
Com as vitórias na África, o aumento da autonomia dos aviões, e o fim da guerra se aproximando, a base foi perdendo importância e começou a diminuir o número de americanos em Natal, a quantidade de voos, e a importância da base. Mas ainda ficaram por aqui mais algum tempo depois do fim da guerra e transferiram finalmente a base para a FAB, que já lá havia se instalado no que era conhecido como “base oeste”.
Natal passou de uma cidadezinha de 40.000 habitantes antes da guerra, para uma de quase cem mil ao seu término. Para isso muito contribuíram a chegada dos militares brasileiros, Exército, Marinha e Aeronáutica, cujo número cresceu substancialmente. Além disso, o próprio movimento da base atraiu gentes de todas as partes, que se deslocaram para cá e muitos aqui ficaram. Tempos inesquecíveis.
Este resumo pouco diz da vida da cidade e seus habitantes nesse período. A enorme influência americana mexeu com todos os nossos costumes. Tentarei mostrar algumas dessas modificações em um próximo artigo. Mas retornarei em seguida às confusões “internas” que marcaram nossa vida.
Dalton Mello de Andrade – Escritor, ex-secretário da Educação do RN