RIQUEZA –

Completei 91 anos. Essa é minha riqueza. Chegar na minha idade, com saúde razoável e suficiente para o consumo, mas com a cabeça tinindo, não é fácil.

É bem verdade que me ajudei. Nunca fiz exageros, sempre fui controlado, quase não fumei, pois comecei influenciado pelos colegas do Atheneu, mas deixei logo, tinha horários para tudo (ainda tenho), controlava minhas andanças, tomava minha cerveja, ou meu vinho, também com moderação. Depois da guerra, os americanos trouxeram whisky para Natal. É minha bebida de hoje, mas só sábados e domingos, antes do almoço e me limito a duas doses.

E tive a sorte de casar cedo, num casamento que deu certo. Isso me manteve em casa e ajudou muito a ter uma vida regrada e tranquila. Casamento que fez 68 anos este ano. Quatro filhos, três homens e uma mulher. Que Ione soube criar e os encaminhou muito bem. Todos são formados, os homens engenheiros, e a mulher pedagoga. Todos de bem com a vida, o que nos traz tranquilidade. A única coisa que me magoa, preocupa, me deixa infeliz, é a situação da minha mulher, que sofre de Alzheimer e já deixou este mundo há tempos. Mas, cumpriu o seu papel com extrema competência, amor e paciência até uns dez anos atrás.

É isso o que chamo de riqueza. Bem casado, família organizada, vida tranquila e responsabilidades divididas. Brincava com Ione e dizia: da porta para fora, sou eu; dentro de casa é você. E nós cumprimos esse entendimento à risca.

Ela tinha uma liderança que lhe era natural. Uma palavra dela para os meninos era uma ordem imediatamente obedecida. Às vezes, era comigo, mas eu entendia e aceitava. Na realidade, lembrando o passado, não encontro uma discordância grave nossa, a não ser quando quis ficar morando nos EUA e ela, telúrica, com saudade da terra, parentes e amigos, insistia para voltarmos. Me disse um dia que havia sonhado voltando para Natal. Diz depois lhe disse que tinha tido um pesadelo, voltando para Natal. Mas, confesso, ela tinha razão e a nossa foi mais uma decisão certa dela.

Um sofrimento que você tem, nessa minha idade, é olhar ao redor e se ver quase só. A maioria dos seus amigos já se foram, e fazem uma falta enorme. Compenso isso lembrando as coisas boas que vivemos juntos, das nossas viagens, de nosso encontros de fim de semana para irmos a um restaurante, ou simplesmente tomar um aperitivo, um na casa o outro. Ouvir música, conversar, conviver.  Momentos inesquecíveis, que não substitui a presença, mas diminui o sofrimento da ausência. E tive a sorte de ter ótimos amigos. Como fazem falta!

Como disse no começo, essa é a minha riqueza. Não pecuniária, mas de amizades e de boas recordações. Não têm preço nem concorrentes. E ajuda a gente a continuar a vida!

 

 

 

 

 

 

Dalton Mello de Andrade – Escritor, ex-secretário da Educação do RN, dandrade@dmandrade.com.br

As opiniões contidas nos artigos/crônicas são de responsabilidade dos colaboradores
Ponto de Vista

Recent Posts

COTAÇÕES DO DIA

DÓLAR COMERCIAL: R$ 5,8010 DÓLAR TURISMO: R$ 6,0380 EURO: R$ 6,0380 LIBRA: R$ 7,2480 PESO…

2 dias ago

Capitania dos Portos limita número de passageiros em embarcações de passeio nos parrachos de Rio do Fogo e Touros

A Capitania dos Portos do Rio Grande do Norte divulgou nesta quinta-feira (21), a publicação…

2 dias ago

Natal em Natal: Árvore de Ponta Negra será acesa nesta sexta-feira (22)

O Natal em Natal 2024 começa oficialmente nesta sexta-feira (22) com o acendimento da árvore natalina de…

2 dias ago

Faz mal beber líquido durante as refeições? Segredo está na quantidade e no tipo de bebida

Você já ouviu que beber algum líquido enquanto come pode atrapalhar a digestão? Essa é…

2 dias ago

Alcione, Flávio Andradde e Festival DoSol: veja agenda cultural do fim de semana em Natal

O fim de semana em Natal tem opções diversas para quem deseja aproveitar. Alcione e Diogo Nogueira…

2 dias ago

PONTO DE VISTA ESPORTE – Leila de Melo

1- O potiguar Felipe Bezerra conquistou o bicampeonato mundial de jiu-jitsu em duas categorias, na…

2 dias ago

This website uses cookies.