A presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Rosa Weber, votou nessa quarta-feira (2) para anular o perdão concedido pelo ex-presidente Jair Bolsonaro ao ex-deputado Daniel Silveira (PTB-RJ), condenado pela Corte em abril do ano passado, por estímulo a atos antidemocráticos.
Relatora do caso, a ministra concluiu que houve desvio de finalidade – ou seja, Bolsonaro teria usado uma atribuição do cargo de presidente, de forma aparentemente regular, para tomar uma medida que não tinha como finalidade o interesse público.
“O presidente da República, utilizando-se da competência a ele atribuída pelo art. 84, inciso 12, ou seja, agindo aparentemente em conformidade com as regras do jogo constitucional, editou decreto de indulto individual absolutamente desconectado do interesse público”, pontuou a ministra.
A relatora afirmou que o objetivo do decreto foi beneficiar um aliado político, o que fere a Constituição.
“A verdade é que o fim almejado com a edição do decreto de indulto foi beneficiar aliado político de primeira hora, legitimamente condenado criminalmente por esse Supremo Tribunal Federal”, afirmou.
“O chefe do Poder Executivo Federal, ao assim proceder, não obstante detivesse, aparentemente, competência para tanto, subverteu a regra e violou princípios constitucionais, produzindo ato com efeitos inadmissíveis para a ordem jurídica”, reforçou a ministra no voto.
“A concessão de perdão a aliado político pelo simples e singelo vínculo de afinidade político-ideológica não se mostra compatível com os princípios norteadores da Administração Pública, tais como a impessoalidade e a moralidade administrativa”, prosseguiu.
A ministra seguiu no voto afirmando que a concessão do perdão como ocorrido neste caso poderia criar um “círculo de virtual imunidade penal” em torno do presidente da República.
“Tal proceder na realidade revela faceta autoritária e descumpridora da Constituição, pois faz prevalecer os interesses políticos pessoais dos envolvidos, em contraposição ao interesse público norteador da atividade estatal. Admitir que o presidente da República, por supostamente deter competência para edição de indulto em tais condições, pode criar ao seu entorno um circulo de virtual imunidade penal é negar a sujeição de todos ao devido processo legal, permitindo sobreposição de interesses meramente pessoais e subjetivos aos postulados republicanos democráticos”, ressaltou.
A presidente do STF afirmou que o Estado não pode ser usado para a obtenção de benefícios individuais.
“Não se pode aceitar a instrumentalização do estado, de suas instituições e de seus agentes para, de modo ilícito, ilegítimo e imoral, obter benefícios de índole meramente subjetivos e pessoais, sob pena de subversão, repito, dos postulados mais básicos do Estado de Direito.
A ministra também analisou que os efeitos de indultos individuais não atingem os efeitos secundários de uma condenação – que vão além dos resultados penais, como a inelegibilidade.
O Supremo começou a analisar o caso na sessão da última quinta-feira (27), quando advogados de partidos que apresentaram as quatro ações defenderam que a medida fere a Constituição.
Já a Procuradoria-Geral da República concluiu que o perdão é constitucional – mas só tem efeito sobre as implicações penais da condenação.
Bolsonaro concedeu a Silveira a chamada graça presidencial, que impede a aplicação da pena de prisão e o pagamento de multa, mas os efeitos secundários da condenação permanecem: a inelegibilidade e a perda do mandato.
O ex-deputado foi condenado pelo Supremo, em abril do ano passado, a oito anos e nove meses de prisão por estímulo a atos antidemocráticos e ataques aos ministros do tribunal e instituições, como o próprio STF.
Ele também foi condenado à perda do mandato, à suspensão dos direitos políticos e ao pagamento de multa de R$ 212 mil. Um dia depois, Bolsonaro concedeu o perdão da pena.
O julgamento na Corte será retomado nesta quinta-feira, com o voto dos outros ministros.
Fonte: G1
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