SAINDO DO SÉRIO –
Depois de escrever alguns textos sérios, trago à tona, hoje, um episódio que, anos atrás, sempre ocorria em Natal, no sábado de carnaval.
Por sinal, tenho loucura pelo carnaval, apesar de nunca ter brincado em clubes nem blocos, salvo no interior, na minha adolescência.
Hoje, me divirto, assistindo aos desfiles na TV, ouvindo as músicas dos carnavais antigos do Recife e também dos imortais trios elétricos de Armandinho, Dodô e Osmar.
Pois bem. Zé de Vina, quando não estava trabalhando na usina de algodão da qual era sócio e gerente, gostava de ler jornais e ouvir os noticiários do rádio.
Inteligentíssimo e politizado, também era muito observador.
Décadas atrás, num sábado de carnaval, enquanto ele se dirigia à banca de Jornal, um rapaz com aparência de necessitado e com voz chorosa o abordou, pedindo-lhe um auxílio para o funeral do pai. Entretanto, Zé de Vina reconheceu na fisionomia do rapaz, a mesma pessoa que, em anos anteriores, no sábado de carnaval, lhe pedira auxílio para esse mesmo fim. E no último ano, esse mesmo rapaz lhe pedira ajuda para o sepultamento da mãe. Descaradamente e com bafo de cachaça, estava, agora, repetindo o pedido de ajuda, para, mais uma vez, enterrar a mãe.
Homem vivido e experiente, Zé de Vina encarou o golpista e lhe disse com sua voz grossa e estridente, em tom irritado:
-PAI VOCÊ PODE TER MUITOS!!! MAS MÃE, VOCÊ SÓ PODE TER UMA, seu malandro! Você já me pediu ajuda para enterrar seu pai umas dez vezes. Agora é a segunda vez que você está pedindo ajuda para o enterro de sua mãe. E é sempre no sábado de carnaval, já com bafo de cachaça. Você já está conhecido por aqui como um grande malandro, picareta e enrolão. Pegue o beco e se mande daqui, se não quiser que eu entregue você à Polícia.
O “órfão” se mandou, com medo de ser preso por malandragem.
Deve ter ido aplicar golpes em outro bairro, para poder encher a cara nos dias de carnaval.
Violante Pimentel – Escritora