SÃO JOÃO COM CHEIRO DE SAUDADE –

Estes dias de junho me enchem de saudade, dos tempos idos e vividos em Nova-Cruz (RN), onde nasci e me criei. Vejo-me menina-moça, aguardando a festa de São João.

A nossa casa era um relicário, onde reinavam harmonia e sonhos cheios de esperança

A véspera de São João era um dia cheio de alegria, e os preparativos para a noite festiva começavam pela manhã. Minha querida mãe, Dona Lia, administrava a cozinha e as comidas de milho verde, além de outras iguarias próprias da época.

À tarde, meu pai ornamentava o terraço da nossa casa com bandeirinhas e lanternas coloridas, onde à noitinha se acendiam velas para embelezar a casa.
No final da tarde, era a hora de acender a fogueira, em louvor a São João.
A notícia de que o fogo havia pegado e a fogueira estava acesa, era sinal de sorte, recebida por todos com muita alegria.

O cheiro da fogueira queimando inundava o ar. A fumaça fazia chorar, mas eram lágrimas mescladas de sorrisos e alegria.

Quanto mais o tempo passa, mais sonho com Nova-Cruz. E os meus sonhos tem sempre cheiro de saudade. De ontem para hoje, o centro dos meus sonhos foi o São João em Nova-Cruz, num passado distante, e a saudade se avolumou ainda mais. Despertei emocionada e choveu nos meus olhos.
Vi, no meu sonho, a Praça Barão do Rio Branco, onde fica a nossa casa, transformada num verdadeiro corredor de fogueiras acesas, iluminando os corações. Todas as casas ostentavam a sua fogueira. Ao lado da nossa casa, destacavam-se as fogueiras de Seu José Henrique e Dona Eugênia, e a de Seu Manoel Silvério e dona Conceição. Eram fogueiras enormes, que queimavam até amanhecer o dia.

Minha mãe preparava a mesa com iguarias deliciosas, não faltando canjica, pamonha, milho cozido, bolo de milho verde e pé-de-moleque. O maior destaque viria em seguida: O milho assado na fogueira de São João.

Isso encantava a alma de crianças e adultos.

A noite de São João era uma festa! Os sorrisos de alegria eram contagiantes.

Os músicos amadores, com sanfona, triângulo e zabumba, entre outras músicas juninas, tocavam e cantavam músicas de Luiz Gonzaga, o nosso Rei do Baião; se improvisavam quadrilhas e arrasta-pés, onde todos dançavam animadamente, forró, baião, xote e rancheira, sem a infernal música eletrônica de hoje, que provoca surdez. Como não havia luz elétrica na cidade, as fogueiras, balões, fogos e foguetes eram permitidos, sem restrições.
As lembranças doem dentro de mim. Trago na memória bandeirinhas tremulando, lanternas e fogueiras acesas, e um Céu cheio de estrelas. Todos os corações estavam em festa.

Era o nascimento de São João Batista, primo de Jesus Cristo. Os fogos, bandeirinhas e lanternas coloridas simbolizavam a boa-nova anunciada pela sua mãe, Santa Isabel, à sua prima Maria Santíssima.

As fogueiras aqueciam e iluminavam a nossa alma. E o sereno era o bálsamo que caía sobre as famílias, que enchiam as calçadas, nessa noite de magia, amor e alegria.
Juntando-se a isso, as adivinhações, “casamentos”, noivados, celebrações de parentesco, batizados e juras de amor, trocadas em torno das fogueiras, costumes que faziam parte da cultura popular nordestina e da crendice popular.
Hoje, ao recordar o antigo São João de Nova-Cruz, meus olhos ficam molhados de saudade.

Saudade da Nova-Cruz da minha infância e juventude, e da nossa fortaleza e porto seguro, Dona Lia e Seu Francisco, ninho de amor em torno do qual, nós, os cinco filhos, gravitávamos, e de onde recebemos os maiores exemplos de vida.

 

 

Violante Pimentel – Escritora

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