AB DIOGENES DA CUNHA LIMA

  Diógenes da Cunha Lima 

“Seja assim o teu falar: sim, sim; não, não.”  Esta é ordem de Jesus (Mt 5,37)

Cristo ensinou a não jurar em vão, inutilmente.  As pessoas devem cumprir os juramentos feitos ao Senhor.  Jesus acresceu o ensinamento para que não jurássemos nem pelo céu, nem pela terra, nem pela cidade do grande Rei. A nossa própria cabeça não deve ser objeto de juramento.   Entretanto, os santos juram, São Paulo jurou, sim.

Infelizmente, há pessoas que quando dizem sim é não, dizem não e é sim.  Quando estão mais próximas da verdade é quando dizem talvez.  Tudo isso provém do Maligno.

A palavra jurar vem do latim jus, juris, o direito.  O juramento invoca uma maldição para quem faz pelo descumprimento da palavra.  Pode atrair um desastre para quem é falso.  Estabelece o juramento uma obrigação unilateral, uma ligação, um vínculo.  A palavra jugo tem a mesma origem. No interior, a palavra jurado pode ter o sentido de ameaçado, até de morte.  É grave, é muito grave a invocação do nome de Deus.  São Tomás, na Suma Teológica adverte que “Deus não pode de modo nenhum ser nomeado por vós”.  Assim, os antigos diziam apenas Adonai, o Senhor.

Um salmo de Davi lembra que é bem-aventurado o varão que tem prazer na lei do Senhor.  Todavia, as emoções, os sentidos humanos tendem a enganar, a levar a pessoa a descumprir o que   prometeu, a quebrar o juramento, a ferir a lei.  Shakespeare em A tempestade, registra o que fazem as paixões: “Os mais fortes juramentos são palhas para o fogo dos sentidos”.

Os papas juram desde o reinado de Santo Agato, portanto há mais de mil anos,  no dia da coroação.  Juram em latim,  a não diminuir ou mudar nada daquilo que encontram, a conservar e venerar o passado.  Invocam a Deus para, no descumprimento, que Ele não lhes seja propício no dia do juízo.

Os médicos continuam a fazer o juramento de Hipócrates que invocava, no seu tempo como testemunhas, todos os deuses e deusas.  Quer recompensa para o médico pelo exato cumprimento da promessa solene: gozar felizmente da vida e da profissão.  A maldição é receber o contrário, se do juramento se afastar ou a ele infringir.

Os julgamentos variam de fórmula verbal,  gestos e simbologia.  Abrahão manda (Gn. 24.2): pone manum tuam subter femur meum, pôr a mão debaixo da coxa dele para poder jurar.  Há povos que juram pela genitália. Os soldados perante a bandeira nacional juram servir à pátria. Em Nova Cruz, aprendi a jurar beijando os dedos indicadores em cruz. No Clube dos Inocentes, ajoelhado sobre almofada vermelha, minha cabeça sob espada, Câmara Cascudo me fez jurar a promessa dos iniciados: “Juro e prometo, sob a minha honra, ser rei de todos e escravo de cada um”. Amizade é para isto: o amigo reina sobre todos os amigos e é escravo de cada um deles. Juram os formandos na colação de grau, os bacharéis perante Deus e a história.   Em Angola, jura-se com a mão direita sobre o peito e a esquerda apontando o céu.  Em muitos países, existe o juramento com a mão sobre a Bíblia para dar testemunho em juízo.  No começo do nosso Império, os senadores juraram cumprir as obrigações “aos Santos Evangelhos”.  Todos cumpriram.  Quem pode falhar com o juramento, se teve uma testemunha importante como Deus?

A Vulgata usa o verbo ser para mandar que falemos assim: est, est; non, non,  ou seja, sim, sim; não, não.

  Diógenes da Cunha Lima – Presidente da Academia de Letras do RN

 

 

 

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