Antes de tudo, desejo Boas Páscoas a todos. Nesta data, entre muitas recordações, lembrei-me da Semana Santa de meu tempo. Sobre esse tempo quero fazer alguns comentários, que façam os de minha geração se lembrarem, mas, especialmente, tragam aos mais jovens conhecimentos de coisas que talvez não conheçam, ou nem mesmo ouviram falar.
Um comentário inicial. Todos esses comportamentos são locais. Vêm, claro, dos nossos costumes e vivência. Quando fui fazer meu mestrado nos EUA, na quarta-feira da Semana Santa, perguntei a um dos professores, que era meu amigo: tem aula amanhã e Sexta-feira da Paixão? Por que não, perguntou. Expliquei que era por conta da Semana Santa. Ficou surpreso e disse: aqui não tem isso não, aula normal.
No meu tempo de menino e de adolescente, as coisas eram muito diferentes das de hoje. Lembro-me de meu avô, que comprava uma barrica de bacalhau e um saco de farinha de mandioca, botava na porta de sua casa e me mandava sentar ao lado. Qualquer pessoa que pedisse uma esmola, na quinta e na sexta, recebia um pedaço de bacalhau e uma cuia de farinha. Fiz isso vários anos.
Os homens não faziam a barba. Muitos nem sequer tomavam banho. Ficavam contritos e respeitosos, falando baixo e tratando todos com respeito e delicadeza.
As procissões referentes à data continuam. As do meu tempo, tinham muita gente. A do Encontro, que vinha da Igreja do Bom Jesus, encontrava-se com a que saía da Catedral, na Praça Sete de Setembro. Meu tio, Monsenhor Calazans, era dos habituais a fazer a Homilia. Todas elas, ou quase todas, passavam na Vigário Bartolomeu, onde morava meu avô, onde hoje é o Banco do Nordeste. Nunca me esqueci da do Senhor Morto, e o som das matracas.
Quando Natal inaugurou uma estação de rádio, a REN (Rádio Educadora de Natal), passava o dia todo da sexta tocando apenas música clássicas. Nada de música popular ou barulhenta.
Já casado, aí pelos começos dos cinquentas, nas Sextas-feiras Santas, íamos para o Iate, então ainda Flotilha de Snipes, pelo hábito. Mas, não botávamos os barcos n’água, não bebíamos nada que tivesse álcool, e ficávamos só conversando. Respeito total ao dia, sem demonstrar qualquer alegria.
E a comida? Muitos faziam jejuns; a grande maioria comia apenas peixes. Todos os católicos respeitavam essa tradição. Não bebiam nada, nem mesmo vinho, bebida usual em todas os acontecimentos cristãos. Total observância dos ensinamentos religiosos de então.
Impossível comparar aos tempos de hoje. E sou mais dos dias atuais. Cada um respeita esses dias, mas mantêm suas crenças, e seus padrões, sem alterá-los. Isso não é desrespeito à religião, mas apenas fruto das realidades e dos novos tempos que vivemos.
Dalton Mello de Andrade – Escritor, ex-secretário da Educação do RN