SOLIDÃO, SOLIDÕES –
A solidão de Cristo na cruz foi a mais cruel e agônica. Jesus, coroado de espinhos e entre dois ladrões, tinha sido pregado após caminhar sozinho, abandonado pelos discípulos e, ainda mais, ciente da traição de Pedro. Ele não pôde segurar o grito na garganta e bradou: “Pai, Pai, por que me abandonaste?”.
Solidão, o sentimento de ausência de outros, vem do latim solus que faz inclusive referência à unicidade do ser.
O ser solitário não é apenas comparável ao homem num deserto, mas quando traz o vazio para dentro de si, para o mais íntimo do seu coração. Talvez lembrando o Mestre, Carlos Pena Filho define o ápice da solidão: É quando “até Deus em silêncio se afasta”. O Poeta, conhecedor do bom aproveitamento da brevidade da vida, aconselha logo: “Lembra de que ainda te resta a vida / com tudo que é insolvente e provisório / e que ainda tens uma saída: / entrar no acaso e amar o provisório”.
Há pessoas amorosas da solidão que a buscam e satisfazem-se no isolamento para ficarem em solilóquio, dialogando consigo mesmas. Algumas, possuidoras de talento, são imaginativas, criativas, extraem maravilhas do seu retraimento. Goya era pintor da corte espanhola e fez o retrato de Fernando VII. Ambos se detestavam. Logo, foi substituído por pintor arrumadinho e medíocre. Goya passou a viver em sítio longe de tudo e de todos. Então, provou ser o gênio na fase chamada “Pintura Negra”. Muitos, como ele, brilham solitários, mas, como o sol, queimam quem deles se aproximam.
Ninguém está sozinho quando pensa. A reflexão é de Câmara Cascudo. O meu mestre sabia das coisas e de como dizê-las. Quando estamos pensando, atraímos coisas e gente para a nossa companhia.
Os poetas costumam povoar a solidão com palavras.
Dinarte Mariz, em sua fazenda “Solidão”, deitado em rede branca, perguntou-me por que eu estava gravando. Disse-lhe que iria escrever a sua biografia. E ele: “Se for para me elogiar, publique logo. Em meio a perguntas triviais, arrisco uma surpresa: Senador, o que mesmo pertence ao homem? Após breve reflexão, ele responde: “A única coisa que pertence verdadeiramente ao homem é a sua solidão”.
Parece que está havendo uma epidemia de solidão. Há, inclusive, iniciativa governamental para, ao menos, minorar os seus efeitos. O Reino Unido acaba de criar uma Secretaria, verdadeiro Ministério da Solidão. A decisão de Tereza May teve por base a verificação da Cruz Vermelha de que havia nove milhões de solitários entre os 66 milhões de habitantes do reino.
Se a moda pegar, vai ter gente pedindo a Bolsonaro um novo ministério.
A nova ministra Tracey Crouch terá muito trabalho e precisará de muita capacidade inventiva para minimizar a tristeza de tantas pessoas. Aproveitará a antiga “Comissão da Solidão” e mais de uma centena de projetos, orçados em cem mil libras cada um, destinados ao assunto. Muitos voluntários já trabalham contemplando os solitários através de diálogos, apoio, calor humano.
Diogenes da Cunha Lima – Advogado, Poeta e Presidente da Academia de Letras do RN
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