Claudia Sta Rosa

Tomo a ideia de “excelência” enquanto característica daquilo que tem grau elevado de qualidade e perfeição. Já o “expediente” que aqui nos interessa tratar, diz respeito ao horário de funcionamento de um serviço que envolve a execução de tarefas diárias ou rotineiras. Feito esse preâmbulo, registro uma constatação: de norte a sul do país é comum se ouvir adjetivações reprovadoras sobre a qualidade dos serviços públicos oferecidos à população. Não é por acaso. Verifica-se, amiúde, que os órgãos que conseguem amalgamar eficácia e eficiência são mesmo cada vez mais exíguos. Na maioria, apesar do elevado número de servidores, o expediente é frágil!

Servidora pública, desde o ano de 1990, nunca entendi muito bem a utilidade do “livro de ponto.” Tem coisa mais chata do que assinar aquele livro, todos os dias, e informar o horário de entrada e saída? Sempre achei que seria mais sensato registrar quando surgisse o extraordinário: a impontualidade, a falta, o atestado médico. O ordinário é cumprir o expediente, integralmente e com assiduidade, aquilo que deve ser o trivial.

Do arcaico livro, suscetível aos registros extemporâneos, já são incontáveis os órgãos que adotam o sistema de ponto eletrônico, um terror para muitos “servidores”, chegando a ser objeto de protestos. Destarte, o controle excessivo de expediente de quem é remunerado para cumpri-lo, revela a falência da ética que tanto faz falta, é verdade, à gestão pública e que gera prejuízos. Igualmente, o controle expõe as dificuldades de gestão, cujo amadorismo fortalece a raiz dessa questão: o cultivo da cultura do tudo é aceitável no serviço público, do sempre se dá um “jeitinho”.

Neste sentido, a tarefa da escola também se apresenta grandiosa. Explico: como contribuir para refazer uma cultura de fracasso, educando as crianças e os jovens – as próximas gerações – para naturalizarem a flagrante subtração de expedientes, de dias que deveriam ser produtivos? Fico impressionada com os decretos governamentais de pontos facultativos somente para gerarem os festejados “feriadões”, assim como tem sido fácil a promoção de dias “imprensados” (segundas e sextas-feiras), quando há feriados na terça ou na quinta-feira. Também é comum professores faltosos sugerirem que os seus alunos sejam dispensados, a maneira mais fácil que vislumbram para solucionar o problema das suas ausências nas salas de aula, contrapondo-se ao discurso de apelo à formação do cidadão que se empodera para agir e intervir no mundo, criticamente.

Diante das mais recentes conquistas sociais, assegurar os direitos civis, políticos e sociais já não bastam para caracterizar a cidadania, aquela que nãoéresultado de uma outorga do Estado e passa a ser compreendida como uma construção social, desde a mais tenra idade. Daí a relevância dos papeis da escola e da sociedade, na tarefa de formar, desde a infância, a partir de um quadro de valores que esteja coerente com as transformações que o país enseja. Essa intencionalidade se coaduna com a emergência de se fazer excelente a oferta dos serviços públicos, evocando qualidade, necessariamente, do expediente.

Cláudia Santa Rosa – Educadora e Diretora Executiva do Instituto de Desenvolvimento da Educação – IDE ( [email protected] )

 

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