TABELA DE BASQUETE –
Nunca parei para pensar sobre a tabela de basquete. Demorei a entender a diferença entre cestas de 1, 2 ou 3 pontos. Aprendi! Sério! Entretanto, para mim, a tabela de basquete, a rede do vôlei, a trave do futebol, enfim, estas coisas são partes essenciais destes esportes, as quais não me chamam atenção alguma. Estão lá, nos lugares delas e só! Assim, a tabela sempre foi… Uma simples tabela! Uma tábua com uma cesta furada, onde vejo gigantes de 2,5m que pulam mais 5 metros e se penduram nela, fazendo pontos e um espetáculo à parte.
Mas, para Flávio, jogador apaixonado, não é bem assim. A tabela tem um quadrado (ou retângulo?) desenhado e a sua localização é crucial para sua paz espiritual. Por isso, sai ano, entra ano, escuto-o reclamar de uma tabela virada de cabeça para baixo, num prédio perto a nossa casa.
A primeira vez que ele reclamou me chamou atenção. O que o incomodava tanto? Um quadrado (ou retângulo?) desenhado em cor preta que estava abaixo da cesta! Qual o problema disso?, me perguntei atordoada.
No segundo dia, vi-o balançando a cabeça ao vislumbrar a cena. Perguntei o que o incomodava e ele, meio aborrecido, disse que não se conformava de ninguém no prédio perceber aquela montagem errada. Desde o momento deste diálogo, isto se repetiu inúmeras vezes. Mesmo quando ele se silenciava, eu o via olhando de soslaio para aquela tabela e eu tinha vontade de rir.
Os anos passaram, a pandemia chegou, a pandemia fez de conta que foi embora e, em um determinado dia, a tabela não estava mais ali.
Flávio, feliz como uma criança, acreditou que haviam removido para pôr corretamente. Os dias se passaram. Ficamos ansiosos. Até que, ao voltarmos da academia, vimos a tabela em seu lugar.
Tiraram para pintar. Mas, acredito eu, a pessoa que fez a arte e teve o trabalho de colocar na quadra novamente, sabe tanto de basquete quanto eu: foi recolocada de forma errada, igualzinho ao que era no passado, só mais branquinha, pintada como se fosse nova.
Eu gritei feliz:
Flavinho bufou e me olhou raivoso:
Eu engoli a gargalhada e pensei em como me acostumei àquilo. Uma cesta virada de cabeça para baixo, assim como nosso mundo às vezes fica. Isto o incomoda. Para mim não passa de um simples detalhe. Como as latas de molho de tomate em nossa cozinha. Gosto delas com o rótulo principal virados para mim. Isto não tem importância alguma para ele. Coisas do cotidiano que, mesmo erradas, ou fora do convencional, fazem a gente seguir a vida compreendendo suas imperfeições e convivendo com elas…
Até mesmo de cabeça para baixo…
Bárbara Seabra – Cirurgiã-dentista, professora universitária e escritora
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