TRADIÇÃO E LOUVOR –
A CAPELA DE SÃO JOSÉ
Ela fica na Guarita. Hoje está um pouco maior, depois de reconstruída em local diferente; mas já foi pequenina, aconchegante, postada bem na margem da ferrovia, o oitão dando para a linha do trem e os muros do Cortume de João Motta. No pátio – ou largo – armavam-se as barracas e o parque, durante as festas do padroeiro. Ali, sob a liderança do padre João, disputávamos, eu e mais dois amigos, a preferência para integrar as equipes das celebrações, acionando o sino do campanário, as sinetas no altar, agitando o turíbulo ou, até, acendendo suas brasas para isso. Atividades que nos enchiam de orgulho e nos davam esperança de reconhecimento terreno e celestial. Queridinhos na terra, anjinhos no céu.
Há alguns anos, quando, com um amigo, visitei o local, encontrei a capela desfigurada e abandonada, desde a construção do novo templo, perto dali. Primeiro ocupada por desordeiros, transformou-se depois em oficina de marcenaria. O maquinário, a madeira usada ou estocada, a desordem, os detritos e a serragem espalhada conspurcaram a originalidade das suas pinturas, desfiguraram o seu piso, apagaram a via crucis pintada nas paredes e destruíram os pequenos nichos onde repousavam antigas e delicadas imagens.
E não foi possível conter as lágrimas de saudade e decepção pelo descaso de todos com aquele lugar tão histórico e sentimental. É verdade que a capelinha se tornara pequena e inapropriada para a demanda dos fiéis de uma população em crescimento. Pelo que sei, a nova construção tem atendido às necessidades e há muito tempo está perfeitamente integrada nos movimentos católicos da comunidade. Mas eu acho que não custaria grande esforço tentar preservar a antiga igrejinha, a querida capela. Torná-la um museu, uma biblioteca, uma escola, qualquer atividade que a mantivesse de pé, alimentando saudades, lembranças, ou recordações de um tempo de sonhos modestos, desejos contidos e limitadas ambições.
HINOS E LOUVORES
Como membro da Igreja Presbiteriana, conheci um atributo muito importante das igrejas reformadas. Qualquer denominação protestante séria tem na sua hinologia, no louvor musical, um elemento imprescindível para o exercício da adoração. Assim, como simples congregado, como cantor coralista e solista e depois como regente de grupo coral, deixei-me envolver pela beleza de tantas composições tradicionais, tratadas com zelo e competência por autores e arranjadores que encheram as páginas dos hinários com centenas de soberbas e inspiradoras obras. As tendências mais recentes, entretanto, provocaram mudanças na liturgia musical e, encampadas pelos mais jovens, foram introduzidas nas igrejas novas formas de se cantar, de se louvar.
São mudanças naturais e devem ser acatadas. Na tradição católica, os primeiros hinos executados e cantados em polifonia eram combatidos por aqueles que viam na novidade uma falta de respeito com o cantochão tradicional, largamente utilizado nas celebrações medievais. Hoje, os temas sacros polifônicos, execrados no passado, fazem parte da identidade Católica Romana. Na Igreja Presbiteriana, no bairro das Rocas, alguns membros menos tolerantes rejeitavam com veemência o acompanhamento de um inocente violão recém adotado na igreja.
Para eles, o instrumento, embora eclético e mundialmente utilizado, não se prestava para a música sacra. A preferência era por um antigo e acústico órgão de fole, agora esquecido, vencido e substituído pelas guitarras e teclados eletrônicos musicais celebrados e cultivados hoje. Tais tendências viriam provocar tristeza em alguns regentes tradicionais, incluindo este escriba, que viram desaparecer o interesse da maioria das congregações pelo canto coral nas suas igrejas. Alguns coros ainda existem, mantidos com valorosa determinação e trabalho por alguns resistentes, que cultivam com esforço heroico esta forma sublime de um crente expressar o seu louvor.
Alberto da Hora – escritor, cordelista, músico, cantor e regente de corais
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