TRANSBORDANDO… –
Hoje eu estou transbordando sentimentos diversos: amor, felicidade, incertezas, tristezas, remorsos e até mesmo orgulho. O momento, este que estamos vivendo, é algo indescritível, muitas dúvidas e certezas que se cruzam a cada instante. Dúvidas sobre nosso futuro, sobre o que nos espera. Certezas sobre alguns fatos que não mais toleraremos e nem permitiremos que se repitam.
Tem uma frase que uma amiga sempre me diz, e que internalizei como se fosse minha… Sim, eu me apropriei veementemente do pensamento de que “posso até não saber o que quero, mas tenho certeza do que não quero mais na minha vida”. Bem isso.
Estou escrevendo essas linhas numa segunda-feira, à tarde. Hoje é dia 08 de março, Dia Internacional da Mulher. O sol castiga lá fora, sinto o mormaço entrar pela janela, misturando-se ao vento quente que sai do ventilador, bem a minha frente. As ideias estão embaralhadas, meio confusas. O que não deveria acontecer, afinal, lutamos tanto por esse reconhecimento e agora, diante de tantas manifestações, eu me encontro aqui, lendo artigos e matérias sobre empoderamento feminino.
Sim, eu sou uma das que luta para ter a liberdade reconhecida e respeitada. Nem preciso dizer que já ousei para fazer valer esse reconhecimento e valorização. Não é tarefa fácil sermos reconhecidas como iguais, como mulheres que trabalham, lutam, criam filhos, choram e desejam a felicidade; que lutam por momentos de bons gozos, buscando desfrutar dos instantes prazerosos que a vida oferece, isso, sem negar os perrengues; enfim, eles nos ensinam e nos impulsionam muito mais que os momentos de alegria, que tendem a nos deixar estagnados.Ah, o ego!
Hoje estou transbordando sentimentos que me causam questionamentos sobre alguns posicionamentos, e certas hipocrisias, nesse dia simbólico. Eu não quero parecer pessimista, porém não tem como fechar os olhos para certas postagens, cheias de palavras bonitas, com frases de efeitos, mas que na prática está carregada pelo preconceito e pelo machismo. Muitas foram as mensagens que recebi neste dia, a maioria de homens extremamente machistas. Devia me surpreender? Talvez não. O mais difícil mesmo é ler a mensagem e tentar relacionar com quem enviou.
Merecemos mais que um dia simbólico, merecemos mais que mensagens copiadas e coladas, frases feitas e que deveriam surtir algum efeito, deveriam ser impactantes… para mim foram, sim, só que num sentido contrário. Confesso que esse 8 de março está sendo bem diferente dos demais, para mim. Estou introspectiva ao passo que transbordo sentimentos diversos e conflitantes, porque não assim dizer? Feliz por um lado, pelas conquistas que alcançamos, pelos espaços que conseguimos, pelo grito que não se calou diante das injustiças, do machismo e do preconceito. Triste por ver que, apesar de estarmos nasegunda década do século 21, ainda caminhamos a passos de tartaruga na luta por nossos direitos, algo que deveria ser natural, como respirar.
Custa-me ter que lembrar dos nossos direitos, diante de situações constrangedoras. Custa-me perceber que às mudanças da igualdade de gênero ainda são hiper lentas. Eu mesma me sinto, muitas vezes, impotente diante de um mundo desigual e cruel com suas mulheres, digo isso não só com relação aos homens, também com as mulheres machistas que nos criticam, quando deveriam estar deste lado, apoiando-nos mutuamente, incentivando e defendendo umas as outras.
A luta pela concretização de nossos direitos está longe de seu final, talvez nunca chegue, e que bom que nunca chegue, pois, outros momentos virão, outras necessidades existirão e precisaremos que outras mulheres deem continuidade nessa luta, garantindo nosso espaço, exigindo respeito e igualdade. Estou nesta luta com vocês, minha caminhada ainda é longa. Tenho muitas esquinas para virar, muitas avenidas para cruzar. A estrada é imensa e eu tenho buscado disposição para pilotar minha vida, mesmo com todos os obstáculos que nela existe, mesmo com as ruas sem saídas, beco, vielas…
Vamos em frente e enfrente!
Flávia Arruda – Pedagoga e escritora, autora do livro As esquinas da minha existência, [email protected]