Rinaldo Barros (*)
Caranguejo não tinha! Era dia de churrasco comemorativo pelo aniversário de 70 anos de um dos membros da confraria.
Mas os fiéis, os do tempo do Cuxá, foram chegando. Aliás, Ugo Vernomenti já estava lá. Santiago entrou junto comigo, e à mesa sentamo-nos. Com pouco, chegaram Rosadinho, Medeiros, Galo Véio, Bulhões de Carvalho, Olecram, Mag, Dora, Hora H, Herideb e mais cinco ou seis da nova geração. Depois dos calorosos abraços, renovados de sábado em sábado, Pereirinha trouxe a gelada e o picado. Adivinhem por onde começou o bate-papo?
Quem lembrou futebol, seleção ou gênero, errou! O assunto introdutório foi a crise.
Santiago disse que o desvio de conduta de alguns põe o rebanho a perder. A crise é ética, sustentou. Ugo não disse nada porque, como sempre, depois do segundo copo, silencia. Rosadinho falou da retração econômica que está afetando negativamente as vendas de seu pequeno negócio. Herideb entrou de sola: a crise é política! “Estamos com o barco à deriva, sem governo, tanto lá como aqui, mentiram para o povo, estão sem moral para governar”.
Concordo no atacado! A crise é ampla, em sua receita estão presentes os ingredientes que eles apresentaram. Na verdade, a crise é do sistema de poder que nos governa desde sempre. Perguntei-lhes: vocês que são empresários, qual o percentual de impostos sonegados no Brasil?
Entreolharam-se em silêncio. Bulhões arriscou: eu acho que ultrapassa 50%. Não? Não chega a tanto, creio que uns 30%, disse Medeiros. Galo Véio palpitou, falando em 20%.
Sacanagem, né! Na verdade, a sonegação é a primeira das três grandes sacanagens que infelicitam o Brasil. A sonegação fiscal nada mais é do que o roubo de impostos já devidamente pagos pelo cidadão. Estudos sobre a arrecadação concluíram que 27,6%, ou R$ 518,2 bilhões, foram sonegados em 2014. Dinheiro graúdo surrupiado antes de entrar nos cofres do governo.
É no encalço dessa fortuna que os federais se ocupam por meio da Operação Zelotes.
É muita grana em poucas mãos. É muita corrupção de cima a baixo e de Leste a Oeste.
Para tapar esse gigantesco rombo, o governo nos apronta a segunda sacanagem. Durma-se com um barulho desses: quando não aumenta impostos, recorre aos bancos e aumenta os juros. Aí, então, o bicho pega de vez! Ficamos reféns da agiotagem do sistema financeiro, de maneira que, de tudo o que produzimos, quase metade vai parar de mão beijada nas burras dos banqueiros. Ano passado, entre juros e amortizações, pagamos R$ 970 bilhões. Eu pensava que a dívida ia diminuir, mas que nada, este ano ela aumentou. Até outubro, já estava próxima de R$ 800 bilhões. Uma tragédia!
Ufa! A terceira grande sacanagem acontece na ponta da aplicação dos recursos, nas obras públicas e serviços prestados ao governo. Atividade criminosa conhecidíssima, identificada como corrupção, que drena, segundo estudos da Fiesp, entre R$ 60 a R$ 100 bilhões ao ano. É tanto ladrão que não há cadeia que chegue.
Somem as três sacanagens e me digam: tem lógica um negócio desses? Esse sistema político perverso, que assegura a uns poucos o direito de passar a perna na maioria, é tão antigo quanto o Brasil. Tem saída? Claro!
Estou seguro que sim, no entanto, urge um freio de arrumação capaz de colocar cada um no seu quadrado, tal qual está fazendo o juiz Sérgio Moro na Operação Lava Jato.
Conversa de boteco é assim: assunto vem… assunto vai… De repente, Santiago interrompeu com suas histórias engraçadas da terra do Sal, lugar onde metade dos presentes nasceu. Contou-nos a saga do grego Mikail Alexopoulos, que, descoberto viajando clandestino em um cargueiro, foi atirado ao mar na foz do Potengi. Reza a lenda que nadou horas até chegar à cidade ribeirinha do Açu, perto da Ilha de Monxoró.
Dali nunca mais saiu, virou comedor de camarões, constituiu família e deixou muitos descendentes, entre eles o neto, Alexis Alexopoulos. Nosso confrade Ugo Vernomenti não confirma e nem desmente a história, pois, como sabemos, depois do segundo copo, não há no mundo quem consiga dele tirar uma só palavra.
Espero um dia desses encontrá-lo antes do primeiro gole para que, em detalhes, conte-me o que de fato aconteceu com seu avô grego. Afinal! Não custa lembrar, Ugo é um bom contador de causos, logo, pode-se imaginar ter ele entortado, pelo meio do caminho, a história das três sacanagens.
“O que me assusta não são as ações e os gritos das pessoas más, mas a indiferença e o silêncio das pessoas boas”, disse Olecram antes de ir embora sem explicar que a frase é do Martin Luther King.
Como diria Chicó, “Eu não sei como é que foi, só sei que foi assim”.
(*) Rinaldo Barros é professor – rb@opiniaopolitica.com
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