Há um ano, no feriado de 7 de setembro de 2019, o Rio Grande do Norte registrava a chegada de manchas de óleo ao seu litoral, em um caso que se transformou no maior desastre de vazamento de óleo no país. Pelo menos 43 localidades, distribuídas em 14 municípios da costa potiguar, foram afetadas. Ao todo, 130 municípios brasileiros foram atingidos a partir do final de agosto, em nove estados do Nordeste e dois do Sudeste.
Passado esse período, as investigações ainda não apontaram culpados. Os prejuízos ambientais também não foram esclarecidos. Para alguns pesquisadores, os efeitos do vazamento sobre o ecossistema marinho ainda poderão ser sentidos pelos próximos anos, mas faltam recursos que financiem diagnósticos precisos.
Já os prejuízos econômicos estimados pelo governo do estado e instituições envolvidas ultrapassam os R$ 621 mil – mas esse também é um número subdimensionado. Trata-se apenas das somas de parte dos gastos dos órgãos estaduais envolvidos nas ações de mitigação e do Projeto Cetáceos, que atendeu animais oleados na costa potiguar.
De acordo com levantamento das autoridades estaduais, 34 toneladas de óleo foram recolhidas das praias do RN. 15 animais, sendo 14 tartarugas e uma ave atingidas pelo óleo, foram resgatadas. Cinco sobreviveram. Nenhum caso de intoxicação humana foi registrado pelo sistema de saúde do estado.
Embora as imagens das manchas tenham sumido das praias no final do ano passado, pelotas voltaram a ressurgir na areia no litoral sul entre junho e julho de 2020.
Números da crise no RN
- 34 toneladas de óleo recolhidas e usadas na indústria de cimento
- 14 municípios afetados
- 43 localidades
- 15 animais oleados
- Pelo menor R$ 621 mil a ser ressarcido
Apesar dos prejuízos estimados, ainda não se sabe quem irá ser responsabilizado pelo desastre e pagar a conta. Isso porque até hoje o autor do vazamento não foi revelado. Investigações apontam que o óleo tem origem na Venezuela, mas isso não quer dizer que o óleo vazou de uma embarcação do país sul-americano.
A Superintendência da Polícia Federal e o Ministério Público Federal do Rio Grande do Norte foram procurados para falar sobre as investigações, porém ambas as instituições informaram que não comentariam o caso, por estar em andamento. Já a Marinha do Brasil finalizou parte das investigações sem apontar culpados e sem revelar a origem exata do derramamento. Segundo o inquérito, o petróleo foi derramado a uma distância de 700 quilômetros da costa brasileira e trafegou submerso por 40 dias.
Para o professor Djalma Ribeiro da Silva, que atua na área de Petróleo do Instituto de Química da UFRN e fez parte do grupo de pesquisadores que acompanhou o incidente no estado, esse é o primeiro caso registrado de um vazamento de óleo extrapesado, que, ao contrário do leve, não flutua na água e, portanto, é mais difícil de ser coletado.
Sem saber quanto óleo realmente foi derramado e o responsável pela desastre, ele considera que o Brasil não conseguirá mensurar os prejuízos ambientais.
De acordo com ele, também faltam recursos para pesquisas mais aprofundadas, que façam diagnósticos do impacto do óleo sobre a vida marinha. “O maior exemplo que temos é o vazamento do Golfo do México, que aconteceu há dez anos e até hoje é mantido monitoramento, com milhões de dólares investidos em pesquisas”, disse.
O professor foi responsável por uma pesquisa que procurou vestígios de óleo em pescados no estado. Os animais capturados na época não estavam contaminados. Porém, ele afirma que o levantamento contou apenas com peixes pescados por uma colônia.
“Aquele levantamento mostrou um quadro daquele momento. Nós apresentamos um projeto para monitoramento de vários tipos de pescados, durante três anos, para avaliar possíveis contaminações e garantir a qualidade, fazer um diagnóstico mais completo no litoral do Rio Grande do Norte e da Paraíba”, conta. A iniciativa, no entanto, não conseguiu recursos para ser colocada em prática.
Após a publicação de um relatório final sobre as ações realizadas no estado, o governo do estado desmobilizou um comando que reuniu várias instituições para lidar com a crise. De acordo com Iraci Wanderley, sub-coordenadora de planejamento e educação ambiental do Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (Idema), uma comissão menor deverá continuar acompanhando os desdobramentos do incidente.
“Ainda é preciso desenvolver pesquisas. Ainda não temos um laudo sobre as consequências para o meio ambiente. Alguns apontam um horizonte de até 10 anos com possibilidade de ressurgências desse óleo”, apontou.
De acordo com ela, o governo realizou levantamento de gastos para monitoramento e outros tipos de serviços realizados durante a crise, e enviou um modelo semelhante para os municípios, mas não recebeu retorno sobre os gastos das prefeituras, que foram responsáveis pela coleta do óleo. Somente com esse tipo de levantamento, será possível cobrar ressarcimento sobre os prejuízos causados pelo derramamento.
Como ainda não há identificação dos responsáveis pelo vazamento de óleo que matou animais marinhos, se impregnou em arrecifes, poluiu praias e prejudicou milhares de pescadores, “os custos relativos às atividades de resposta e mitigação serão cobertos pelo poder Executivo Federal”, conforme indica o Plano Nacional de Contingência para incidentes de poluição por óleo em águas sob jurisdição nacional.
Histórico
- 07/09/2019: Óleo chega à costa potiguar, na Via Costeira, Baía Formosa e Sagi.
- 10/09/2019: Pirambúzios, Barra de Tabatinga, Tartarugas, Camurupim, Barreta, Praia do Giz, Pirambu, Pipa, Praia do Amor, Barra do Cunhaú, Tibau do Sul também são atingidas.
- Entre 07 a 24/09/2019 foram identificadas 43 áreas oleadas no RN – 28 no litoral sul (Natal até Baía Formosa) e 15 no litoral norte (Extremoz até Touros).
- Entre 11 e 12/10/2019 – novo diagnóstico mostrou 43 localidades atingidas, distribuídas entre 30 praias em 10 municípios – 60% do litoral Oriental do estado afetado. Apenas 6% com manchas esparsas
- Entre 22 e 23/10/2019 – 27 praias em 9 municípios voltaram a ser atingidas – 33 ocorrências com vestígios de óleos.
Fonte: G1RN