UM BRASIL ANTIRRACIAL –

Há, atualmente, em setores da sociedade brasileira, o sentimento e a compreensão antirracial. Certamente, um dia vamos chegar lá, como no verso de Fernando Pessoa, para ser grande sejamos inteiros sem nada excluir nem exagerar.

A luta antirracista começou com os primeiros escravos aqui trazidos. Eles sonhavam com a liberdade. Portanto, são séculos de preconceito, desigualdade e injustiça social.

Lideranças intelectuais proclamam razões especiais, como queria Câmara Cascudo, que se orgulhava de pertencer a um povo multirracial. O brancoso Fernando Henrique Cardoso, em campanha para a Presidência, proclamou-se mulato, com “um pé na cozinha”, e Vinícius de Moraes dizia ser também preto. Entre nós há muitos exemplos. Meu pai, um homem despido de qualquer preconceito, brincava dizendo que minha mãe acreditava ser descendente de nobres da História do Brasil, mas as Ramalhos eram resultado do cruzamento das negras do Riacho da Raposa com os cangaceiros do Piancó.

É impossível negar a contribuição africana em nossa miscigenação, também intelectual, na cultura: música, dança, língua, alimentação, alegria de viver. Gilberto Freyre provou a relevância da miscigenação salientando o futebol mulato.

Permanecem, em nosso cancioneiro popular, algumas expressões, de certa forma, preconceituosas. Ataulfo Alves, em “Mulata Assanhada”, escreveu: “ai se eu pudesse retornar à escravidão, eu compraria essa mulata”. Ainda que a levasse no coração. Mas, “depois, a pretoria resolvia a questão.” Pretoria, como se sabe, era o lugar de julgamento, mas também de reunião de pretos.

O linguista Silveira Bueno ensina que a palavra muito antiga, mulato, vem do árabe mualad, que significava o filho de um homem árabe com uma estrangeira. Em oposição, doutrinadores dizem ser de “mula”, animal nascido de união de jumento com égua ou de cavalo com jumenta. Como assim pensava Antenor Nascente, essa última acepção é, com toda a certeza, depreciativa.

Os brasileiros estão avançando em passos largos para entender que o gênero não é apenas binário, enquanto persistem virtuais grilhões da escravidão. Duzentos anos da libertação política, precisamos fazer a verdadeira libertação negra no Brasil.

No ano de 1800, foi promulgada a lei que considerava vadiagem dos capoeiristas, músicos, sem trabalho. Geralmente, atributos naturais dos vindos da África. O seu sofrimento é ancestral e é negado o pertencimento à nossa Nação.

O futuro do Brasil está no ensino fundamental, médio e universitário. Como avançar se apenas 15,6% dos professores universitários são afrodescendentes? Se nos jovens estudantes não é infundido o sentimento ético?

O Brasil é grande, nosso povo aberto a mudanças. Haveremos, pois, de curar as feridas deixadas pela escravidão.

 

 

 

 

Diogenes da Cunha Lima – Advogado, Poeta e Presidente da Academia de Letras do RN

As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores
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