UM MUNDO SEM RELIGIÃO PODE ATIÇAR O MAL –

Hoje não parece ser assim, mas uma vez Lord Acton disse que a religião era a chave da história. Agora, cada vez mais se julga que as grandes mudanças que transformaram a vida humana são resultados de causas econômicas e seculares. O sentimento, expresso por muitos autores, de que a religião foi origem de males, ignorância, fanatismo e violência, ressoam como a tentativa de criação de uma sociedade sem fé, onde a ideologia seja o cimento e o motor, que por longo tempo foi papel da religião. No entanto, como diz Christopher Dawson, em A Criação do Ocidente, Ideologia é muito diferente de fé. A ideologia é produto humano, onde a vontade política tenta moldar a tradição social para dela se servir. A fé leva a humanidade a um campo mais alto e universal, comparado ao finito e temporal, onde gravitam o Estado e a ordem econômica. A fé exerce força transformadora e criativa sobre a cultura, durante sua trajetória histórica, e sobre a vida individual de cada um. Ao contrário, a ideologia é uma força aprisionadora que busca moldar a cultura e a sociedade a seu juízo e capricho. Assim, em vez de retardar as forças da história, a religião e a fé exercem influência sobre a cultura, fornecendo energia para os movimentos de mudança social. Na sua especulação sobre o fim das religiões e a morte de Deus, Nietzsche arriscava que os deuses podiam esperar seu fim de olhos abertos, mas nada podiam fazer para impedi-lo. Em O Crepúsculo dos Deuses, Wagner indicava que eles vão esmorecendo, seja porque outra luz os ofusca ou um escurecimento os torna invisíveis.

O mundo da religião, apontado por Richard Dawkins ou Daniel Denett, como da falsidade, da hipocrisia, do ardil, do fingimento, da violência, não encontrou sucessor no mundo da cultura e da arte, para onde se encaminharam os esforços para providenciar, no dizer de Terry Eagleton, formas substitutivas de transcendência, preenchendo o vazio deixado pela ausência de Deus. Todos os sucedâneos tinham também outras finalidades, entre elas dar sustentação ao fardo ideológico substitutivo da fé. Em 1989 as ruas de Berlim, Praga ou Budapeste viveram cenas de celebração, a vontade do povo havia triunfado sobre a tirania, relata Victor Sebestyen, em seu livro A Revolução de 1989. O modo de vida e a maneira de ver a realidade, o comunismo inspirado por Marx, Lênin e Stalin, foram expostos ao mundo como uma fracassada e terrível experiência. A Ideologia sucedendo a fé, e a perseguindo e esmagando, assumira o poder na sociedade na ponta do fuzil, com a população sendo assassinada, torturada e levada a padecer em campos de concentração. Foi o admirável poder de encanto e a mensagem de esperança de João Paulo II que chamaram as pessoas à resistência à opressão. Foram a religião e o papa, acusados secularmente de opressão, violência e guerras, que trouxeram a libertação para o povo. A luta hoje pode estar em outros campos, mas os objetivos são os mesmos.

As ideologias identitárias, de gênero, misturadas ao racialismo, abraçadas ao individualismo e ao egoísmo, procuram destruir família e religião com o objetivo de sempre, criar um poder absoluto que normatize a vida das pessoas em todos os seus aspectos, controlado pelos interesses de um partido, uma casta ou um grupamento ideológico. O fim da religião e da fé não tornará o mundo mais pacífico. A defesa intransigente das convicções de cada grupo tende a gerar um conflito de todos contra todos, ao contrário da mensagem universal de praticamente todas as religiões, mas particularmente do Cristianismo, da grande comunidade humana. Nazismo, Fascismo e Comunismo mostram que o mal está sempre à espreita, como a serpente no jardim do éden. Peter Sloterdijk colocando Deus como simplesmente a maior fonte de seguro, diz “ Aquele que vivenciou a nossa era em seus aspectos mais sombrios, não consegue se negar à impressão de que o mal é uma instância autônoma de longo fôlego e recursos inesgotáveis; na própria razão do mundo se abre, para usar uma imagem mítica, uma fenda catastrófica, da qual jorram os males com violência arbitrária.”

 

 

 

 

Geraldo Ferreira – Pres. SinmedRN

As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *