UM TEATRO PARA MACAÍBA –
Raríssimos são os municípios do Rio Grande do Norte com tradição de arte cênica. Macaíba é um deles. Desde o tempo dos Albuquerque Maranhão, apaixonados pela música e pelo teatro, na casa do velho Amaro Barreto que encomendava ao jovem Henrique Castriciano de Souza (1874-1947) peças para serem apresentadas em sua casa. É de Henrique a peça “A Promessa” que inaugurou o teatro “Carlos Gomes”, hoje “Alberto Maranhão”. Nas décadas de 1910 a 1930, a teatralização resumiam-se aos dramas (como eram inicialmente denominadas as peças). Foram de autoria de Isabel Freire da Cruz (Dona Beleza) e da professora Arcelina Fernandes. Os dramas eram encenados no palco do cinema ou em palanque armado improvisadamente no salão do grupo escolar “Auta de Souza” com a participação dos alunos.
No começo dos anos quarenta, seu Joca Leiros (1882-1958) fundou com familiares e amigos, um grupo de teatro amador denominado “Grêmio Dramático Auta de Souza”, considerado, à época, um dos melhores do Estado, cuja programação e desempenho artístico dos atores eram citados habitualmente no jornal “A República”. O grêmio do mestre Joca apresentou-se no Teatro Carlos Gomes em 03 de setembro de 1944, com a peça “A Cigana me Enganou”, comédia em três atos e cinco quadros. O espetáculo foi promovido em benefício da construção do teatro de amadores de Macaíba. A direção de Hiran Pereira com cenografia de José Muniz. Em fevereiro de 1945, ocorreu a segunda apresentação em Natal com a comédia “Feitiço” sob a direção de Joca Leiros. A peça patrocinada pela “Comissão do Esforço de Guerra”, da Liga de Defesa Nacional visava auxiliar a construção do hospital da “Sociedade Médico-Hospitalar de Macaíba”.
Após tantos anos de luta ficou patenteada a tradição cultural de Macaíba – até então notável no domínio da música e das letras com Auta de Souza, Henrique Castriciano, Tavares de Lira, Augusto Severo, Alberto Maranhão (na política), Otacílio Alecrim, entre outros – a sua notabilidade também na arte cênica, exercitada com amor, talento e inquestionável sentimento telúrico. Posso destacar excelentes artistas desse universo desaparecido, a começar pelo grande líder do movimento teatral João Viterbino de Leiros (autor e diretor), Luis Marinho de Carvalho (autor e contra-regra), Wilson Leiros, Antonio Coelho, Aguinaldo Ferreira da Silva, Edson Alecrim e Silva, Joanete Ribeiro, Mary Leiros, Ivete Leiros de Almeida, Nitinha Leiros de Almeida, Célia Pereira, Haydée Marinho de Carvalho, Branilze Costa, Alice de Lima e Melo, Luzinete Silva, José Muniz de Melo, Walter Leiros, João Leiros Filho, Luzanira Lima, Geny Maciel, Valda Dantas e Doralice Xavier.
Hoje, Macaíba não tem teatro. Existe uma plêiade de jovens vocacionados mas sem apoio nem esperanças das autoridades competentes. Macaíba precisa de uma casa de espetáculos que faça jus a tradição do passado luminoso. João Marcelino consagrado autor e ator teatral, filho de Macaíba, garanto que não se negaria na formação e seleção de grupos de atores. Sei que há outras necessidades prementes em favor do Município. Mas, o “Teatro Joca Leiros” reacenderia as luzes culturais de Macaíba de há muito apagadas.
Sem sair de Macaíba, lembro do saudoso Joca de Zé Ludovico que ainda hoje é lembrado pelos desportistas como o melhor volante de apoio do futebol macaibense. O seu futebol era inteligente e possuía uma notável visão de jogo. Vi-o atuar várias vezes defendendo a camisa azul do Cruzeiro FC. Nos anos 60, o Cruzeiro havia formado um excelente time que além de disputar o campeonato interiorano sagrara-se várias vezes campeão local. Mas, foi no clássico Cruzeiro x Arsenal de São José do Mipibu que ocorreu uma tragédia com o nosso Joca. O massagista cruzeirense era o famoso Poeta que aplicava uma massagem ritualística nas pernas do atleta com o bálsamo de sua criação chamado “Poetex” (marca patenteada). Nessa tarde o escolhido foi Joca. Os clubes já estavam em campo pousando para as fotos quando o público notou a ausência de Joca, que recebia potentes massagens com o produto “poetex”. Joca, Joca, Joca, gritava a galera pelo seu ídolo. Após vinte minutos de extenuante massagem, Joca é liberado. As equipes já estavam formadas para o inicio do jogo e o juiz já impaciente apitava histérico. Nisso, ouve-se um alarido. Joca entra em campo. Após seis passos começa a ficar trôpego. Manca, cai, se levanta e, afinal, prosta-se aos pés do juiz totalmente combalido. O maqueteiro entra em campo debaixo dos impropérios da torcida. O efeito poetex nocauteou Joca que ficou três dias sem andar.
Valério Mesquita – Escritor, [email protected]