UM TRILHÃO DE CONJECTURAS –

O Blog Ponto de Vista, do jornalista Nelson Freire, prata da casa, publicou um artigo assinado pelo Jornalista Nizan Guanaes, em post separado, sobre a reforma da previdência social que acende os candeeiros no fim do túnel para o futuro do Brasil. Eu não sou contra a reforma da previdência, ao contrário, acho que ela poderia ser mais profunda, e mais sincera, mas, lamentavelmente, como tão bem ilustra o artigo do grande jornalista do Jornal Folha de São Paulo, a quem admiro, e respeito, aliás sou adepto  da diversidade de opiniões como meio de se formar um consenso mais próximo da realidade social, essa a grande intérprete do tempo, o governo preferiu, mais uma vez, o temor apocalíptico, os finais dos tempos. Ou se faz a reforma da previdência como proposta pelo governo ou não haverá futuro para o país, para a sociedade, afinal, estamos falando de uma economia na ordem de R$ 1.200.000.000.000,00 (um trilhão e duzentos milhões de reais), em dez anos, ou R$ 100.000.000,00 (cem bilhões de reais) por ano. Cálculo preciso nos mais precisos dos ábacos. No Brasil apocalíptico os cálculos futuros são mais precisos do que os presentes e passados e que já foram, apocalipticamente, precisos em algum outro momento da história. Uma pergunta intriga, talvez pelo meu pouco conhecimento sobre o assunto, por que o projeto de reforma da previdência, tão  necessário e premente, e Guanaes foi enfático, até ufanista, em seu artigo, precisa de cruzadas messiânicas para ser entendido e aceito pela sociedade, se é que no Brasil a sociedade pode opinar sobre alguma coisa.

Segundo Churchill, o grande estadista inglês, todo fato tem três versões: a minha, a sua e a certa, a não ser que o tal projeto seja inquestionável. Vamos a outra versão. Nada no Brasil foi mais saqueado do que os cofres da previdência social e não falo de corrupção, essa de conhecimento de todos, e fichinha diante do problema, mas de fatos concretos, reais, tungados ao longo da história do jeito que o poder brasileiro gosta, desviando finalidades garantidas por leis igualmente desviadas em seus intuitos. Hoje, no afã do reformismo o governo reivindica a trilionária economia, não importa o custo social que possa causar, mas a ideia é interessante. Agora vamos inverter os fatos. O que responderia o governo se a previdência social, como fundo social soberano, ou deveria ser, que não poderia ser utilizado para outros fins senão a seguridade social, cobrasse R$ 1.200.000.000.000,00 (um trilhão de duzentos milhões de reais) desviados nos últimos dez anos? Isso, ninguém entendeu errado, a conta fica zero a zero. E não digo com meras palavras, mas com números. Segundo o balanço dos gastos tributários levantados pela Secretaria da Receita Federal (SRFB) e anexado a Lei Orçamentária Anual em 2019, por ser obrigatória, as renúncias de receitas, ou benefícios fiscais, ou gastos tributários, ou privilégios, como queiram chamar, sobre os tributos que foram criados para o financiamento da seguridade social, aí vão a saúde e assistência social no cortejo, montam mais de R$ 100.000.000.000,00 por ano. Economiza de um lado, entrega do outro. E não vi Guedes, Lorenzoni,  Maia, Mourão, nem o coroinha da igreja, falar sobre isso. O governo só vê o buraco, mas não se preocupa quem é o dono da pá que o cavou, aliás, ele mesmo.

Tudo bem, os benefícios fiscais são instrumento de política fiscal e servem para promover o desenvolvimento nacional favorecendo a competitividade da empresa nacional. Nem tudo bem. Do mesmo jeito que o cálculo da malfadada economia foi feito com ufanismo, a renúncias de receitas deveriam ter sido pelo menos comentadas, uma notinha de rodapé que fosse. Um exemplo. Para financiar o SIMPLES NACIONAL o governo renuncia cerca de R$ 86.000.000.000,00 (oitenta e seis bilhões) anuais e o último aumento no limite de faturamento, para abranger empresas que faturam até R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais), antes era a metade, acresceu, apenas, um universo de 3% dos contribuintes, ou seja, é uma renúncia, como outras que cochilam no orçamento da união, que poderia ser ajustada com facilidade e sem prejudicar ninguém. Tem mais. Os gastos com o SISTEMA S, que oneram a folha de pagamento em 2,5%, contribui para a informalidade no mercado de trabalho e é dado de mão beijada para o SESC/SENAC/ SESI/SENAI/ SEBRAE e outros S, que fazem assistência social com seu dinheiro e no interesse deles e ainda tem a cara de pau de falar da ineficiência do governo na área social. São R$ 26.000.000,000,00 (vinte e seis bilhões de reais) ano e o destino vai para a pirâmide econômica do país, que festejam os auspícios dos serviços sociais por eles promovidos, sem nem mencionar que seu dinheiro foi junto. E o governo fica fazendo “pantinho”, tal um bode russo,  que vai cortar 30%, mas, por que não 100%? Também não falaram nada a respeito.

Ainda tem espaço para mais algum comentário? A famigerada Desvinculação de Receitas da União (DRU), que em nome de uma racionalidade na utilização dos recursos, o governo tunga, com o beneplácito das leis orçamentárias, 30% das receitas previstas no orçamento, entre elas, as destinadas ao financiamento da seguridade social que, pela lógica, por se constituir num fundo de aplicação vinculada, não deveriam se objeto de contingenciamento. Coloquem na conta, no barato, afinal não tenho um ábaco, R$ 100.000.000.000,00 (cem bilhões) anuais. E não vou falar do IAPC, IAPI, IPASE, seria exigir muito da  memória, que foram criados como solução de décadas atrás, desviados os seus recursos e, entre reformas e mais reformas, jamais devolvido ao caixa da  previdência, como a DRU, como as renúncias de receitas, como … Vigi, vou parar por aqui, são tantos os acertos de contas que até perdi as contas.

Eu não sou contrário ao projeto de reforma, reafirmo, acho que poderia (e deveria) ser mais profundo, e mais justo, mas, sem espada de Dâmocles. Um assunto dessa envergadura teria que ser discutido com a seriedade que ele exige, não com apelos superficiais prós e contras, que em nada esclarecem a complexa verdade que envolve o projeto. É um assunto de extrema importância e que, mais do que a aritmética de um projeto de reforma previdenciária, é a redefinição do modelo do Estado Brasileiro- estado do bem-estar social ou liberalismo, ou neoliberalismo- sem qualquer ideologia, que vença o melhor e que o Brasil não se acabe se o modelo desejado por alguns não for aprovado como gostariam. O governo existe para governar, seja qual for o contexto. Se hoje estamos na situação que apregoam como um assombro, é a prova que sempre fomos mal governados. Bem, façam suas apostas, quem ainda acredita em apostas. Afinal, segundo a Constituição Federal, a coisa pública deve se nortear pela legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade… e eficiência e, como tais, apenas (ou salgar a mão) diminuir o valor dos benefícios continuados, empobrecendo o futuro; e cortar 50% da pensão das viúvas, atentando contra a dignidade aos idosos, como exemplos, não seriam, exatamente, a expressão da norma que se extrai da constituição federal. Mas, quem sou eu para questionar essa tal de constituição, se nem os treze ministros do STF se entendem? Vou repassar a tarefa para Nelson Freire, nosso jornalista, e um homem de ponto de vista.

 

 

Adauto José de Carvalho Filho – AFRFB aposentado, Pedagogo, Contador, Bacharel em Direito, Consultor de Empresas, Escritor e Poeta.
As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores

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