Ayoade Alakija é codiretora da Aliança Africana para a Distribuição de Vacinas — Foto: BBC
Ayoade Alakija é codiretora da Aliança Africana para a Distribuição de Vacinas — Foto: BBC

O surgimento da variante ômicron do coronavírus tem causado polêmica e preocupação em todo o mundo nos últimos dias, especialmente depois que vários países restringiram e até proibiram a entrada de passageiros que chegam em voos de pelo menos seis países africanos.

No Brasil, o Ministério da Saúde afirmou em nota que não registrou casos de infecção pela variante no país. O ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, publicou no Twitter que a partir desta segunda-feira o país vai fechar as fronteiras para voos vindos da África do Sul, Botsuana, Essuatini (Suazilândia), Lesoto, Namíbia e Zimbábue.

Já o presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, disse que seu país – onde a variante ômicron foi detectada pela primeira vez – não pode ser “punido” por ter encontrado a variante graças à tecnologia disponível.

No entanto, uma importante voz tem se levantado sobre o assunto: a de Ayoade Olatunbosun-Alakija, porta-voz da Aliança Africana para a Distribuição de Vacinas, que vem sendo clara em suas críticas e reivindicações aos países desenvolvidos.

“O surgimento dessa variante foi inevitável. Isso ocorreu devido à falta de vacinação e ao acúmulo de vacinas pelos países desenvolvidos”, disse.

A BBC falou com Alakija sobre este assunto. Confira abaixo.

BBC -Você diz que o surgimento de uma variante como essa era inevitável. Por quê?

Ayoade Olatunbosun-Alakija – Era totalmente inevitável. Mas antes gostaria de dizer uma coisa: se a covid-19 que apareceu na China tivesse aparecido primeiro na África, não há dúvida de que o mundo teria trancado a África e jogado a chave bem longe.

Não haveria urgência em desenvolver vacinas porque seríamos dispensáveis. A África teria se tornado conhecida como o continente da covid-19.

O que está acontecendo agora era inevitável, e é resultado de o mundo não vacinar todos com justiça, urgência e rapidez.

BBC – Essa falta de urgência causou essa situação?

Alakija – Países desenvolvidos estocaram vacinas e, para ser muito honesta, essas restrições de viagens aos países do continente africano são inaceitáveis, ​​porque se baseiam em questões políticas e não em pesquisas científicas.

Não temos informações suficientes sore a variante ômicron. O melhor que podemos dizer sobre, do ponto de vista científico, é que não sabemos nada.

Até que todos sejam vacinados, ninguém está seguro nesta pandemia, então qual será a resposta global a este novo desafio? Vai ser uma resposta política para proteger o povo de cada país, evitando a chegada daqueles ‘africanos não vacinados’?

A pergunta a ser feita é a seguinte: por que os africanos não estão sendo vacinados, o que está acontecendo?

BBC – Então a chegada dessa nova variante era previsível?

Alakija – Como já disse, a falta de vontade política e a inexistência de uma campanha global de vacinação – isto é, um esforço que garanta que todos os habitantes deste planeta tenham acesso às vacinas – fez com que esta variante aparecesse em zonas muito vulneráveis ​​da África.

O mundo se recusou a vacinar a todos com o pouco apoio dado à iniciativa Covax (iniciativa liderada pela Organização Mundial da Saúde que visa garantir vacinas a países pobres) ou outros métodos de distribuição.

BBC – A responsabilidade é conjunta?

Alakija – Sim. Sabíamos que essas decisões, esse acúmulo de vacinas por alguns países, nos levariam a variantes mais perigosas. Por que agora estão todos surpresos? Por que estamos fechando a África quando esse vírus já está em três continentes?

Ninguém está se fechando para a Bélgica e para Israel (onde também foram encontrados casos da variante ômicron).

Por que estamos isolando a África? Isso está errado, e é hora de nossos líderes africanos enfrentarem isso.

Fonte: BBC

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