A VIDA É FEITA DE ESCOLHAS –
“Yo no creo en brujas, pero que las hay, las hay” (Miguel de Cervantes in “Dom Quixote”)
O período carnavalesco, para minha pessoa, serviu para – entre outras coisas – refletir sobre o atual contexto surrealista aqui no patropi.
Não sei porque, lembrei de uma frase dita espontaneamente por um jornalista amigo meu quando, num tresloucado gesto cometido há alguns anos, aceitou assumir o cargo de Chefe da Casa Civil do governo do Rio Grande do Norte.
Um dia liguei para o amigo em tela, dizendo que precisava falar urgente com ele para tratar de uma questão burocrática. Ao adentrar o seu Gabinete, ouvi um desabafo surpreendente: “Foi o Cão…quem inventou este cargo”, explodiu meu amigo jornalista, visivelmente incomodado com a situação / postura de autoridade Chefe de todos os demais secretários.
Não precisou explicar. Entendi de prima que se tratava do surrealismo absurdo da função que estava exercendo, enfrentando questões históricas sem solução e com orçamento fictício para suprir problemas reais crescentes; um misto de corrida contra o tempo com a ilusão do poder.
Um salto, de guarda-sol aberto, no pátio da loucura.
Pois bem, guardada a devida distância entre os fatos, o site Congresso em Foco trouxe um levantamento sobre a “maldição” que persegue já nove ministros da Casa Civil do Governo Federal. No caso federal, todos os amaldiçoados estão envolvidos com o processo de corrupção endêmico que assola nossa nação. De Dirceu a Padilha.
Cobiçada pelos políticos por causa de seus superpoderes, a Casa Civil virou sinônimo de problema político e criminal neste início de século. Todos os nove titulares que a comandaram desde 2003 enfrentam complicações na Justiça.
Um roteiro que se repete desde a queda de José Dirceu (PT), em 2005, no auge das revelações do mensalão. Quem não caiu por denúncias no período em que chefiou a casa, a exemplo da ex-presidente Dilma Rousseff, enrolou-se depois. Os ex-ministros sofrem com processos, condenações e até prisões. É a “maldição” da Casa Civil, que persegue Dirceu, Dilma, Erenice Guerra, Antônio Palocci, Gleisi Hoffmann, Aloizio Mercadante, Jaques Wagner, Lula e, agora, Eliseu Padilha.
A maldição alcança até o ato de posse no cargo.
Lula nem sequer chegou a assumir de fato. Assinou termo de posse e foi barrado no dia seguinte pelo Supremo Tribunal Federal, que o acusou de manobrar para escapar do juiz Sérgio Moro na Lava Jato. Hoje é réu em cinco processos.
Divulgação de conversa telefônica entre Lula e Dilma foi utilizada como argumento por Gilmar Mendes para suspender a nomeação do ex-presidente. Segundo o ministro do STF, intenção era fugir do juiz federal Moro. O ex-presidente afirma ser vítima de perseguição política.
Gleisi, atual líder do PT no Senado, também virou ré no Supremo. Mercadante e Wagner são alvos de inquérito da operação. Padilha se encaminha para ser mais um chefe da Casa Civil na relação dos investigados por suspeitas de envolvimento com o esquema da Petrobras.
Amigo e homem de confiança do presidente, o atual chefe da Casa Civil foi um dos articuladores do impeachment de Dilma, a quem serviu na Secretaria de Aviação Civil até dezembro de 2015. Na linha de tiro da Lava Jato, sente agora os efeitos da “maldição” do cargo.
Aposta de Dilma para substituí-la na Casa Civil, Erenice permaneceu apenas seis meses no cargo. Saiu após denúncia de tráfico de influência, que lhe renderia mais tarde voto de censura na Comissão de Ética. Também está na mira da Lava Jato.
Zé Dirceu, o mais poderoso dos ministros de Lula, em seus primeiros anos de mandato presidencial, sucumbiu com o mensalão. Quando já cumpria a prisão em regime domiciliar, foi pego na Lava Jato. A última condenação é de 20 anos de reclusão.
“A Lava Jato sobrevoa os campos do poder tal como uma ave gigante ameaçadora. Os voos estão cada vez mais rasantes”. Mas, o foco na Casa Civil dá o que pensar.
Será maldição? Ou, simplesmente, fizeram as escolhas erradas?
Rinaldo Barros é professor – rb@opiniaopolitica.com
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