diogenes

A vida é uma viagem.  Nós somos passageiros.  De primeira, segunda ou de terceira classe.  Os passageiros não necessariamente ocupam os lugares em função de sua condição econômica, financeira, social.  Por exemplo: Alcides, meu motorista há vinte e seis anos, só gosta de viajar de primeira classe.  Conheço políticos vitoriosos, conheço homens ricos que sempre viajam de terceira classe.

O traço diferencial, ou melhor, as confrontações diferenciais são muitas.  Quem viaja de primeira classe busca ser feliz sendo socialmente útil, é criativo, tira o prazer da natureza ou da arte, aproveita o tempo, o lugar, as oportunidades felizes, ri de alegria. Os passageiros da segunda classe cumprem os seus deveres, regulamentos, pouco riem e nunca dão uma gargalhada, veem, com moderação, a beleza das flores e de alguns objetos de arte.  Os passageiros de terceira classe obedecem apenas às suas próprias regras, riem de zombaria, vivem do trabalho dos outros, não constroem, destroem.

O passageiro de primeira classe é reto e flexível; o de segunda é reto e inflexível; o de terceira é rígido e tortuoso.  O passageiro de primeira classe tem bom humor e, por ter consciência de que a vida é breve, deixa nas coisas e nas pessoas a marca da sua personalidade, a sua impressão digital. O passageiro de segunda classe tem consciência de que vai ser esquecido, mas também de que deve cumprir o seu dever cotidiano.  O de terceira marca a impressão do mal. Os primeiros são padroeiros do saber viver, partilham o pão da alegria, têm elasticidade no corpo e do espírito, viajam sem pressa: que chegar é não mais viajar.  Têm a capacidade estética de ver a beleza das folhas e não apenas das flores, das árvores, dos arbustos e das bromélias.

A primeira classe vive a fantasia, a segunda tenta retirar dos fatos a visão da fantasia e para a terceira a fantasia é mentira.  A primeira conduz, a segunda é conduzida, a terceira não tem destino certo.  A primeira se integra a associações legítimas, a segunda integra as associações mas a elas não se integra, a terceira se integra a uma associação ilegítima.

O passageiro de primeira classe é mais rigoroso consigo mesmo e generoso com os outros, o de segunda é moderadamente generoso consigo e com os outros, o de terceira é somente pródigo consigo mesmo.

Os passageiros de primeira classe nutrem o corpo, alimentam o coração e o espírito, os de segunda alimentam o corpo e pouco alimentam o espírito.  Os de terceira abocanham o alimento.  Os de primeira sonham, os de segunda aceitam e repetem, os de terceira mentem.  Os de primeira são e têm amigos verdadeiros, os de segunda convivem, os de terceira usam das “amizades”.  Para os primeiros o dinheiro é um instrumento, para os segundos um meio de vida, para os outros é a finalidade.

O primeiro cria e celebra a festa.  O segundo comparece, os outros criticam a festa.

O amor para os primeiros é instrumento de simpatia e ação, os segundos amam passivamente, para os passageiros de terceira classe o amor é instrumento de dominação e maltrato.

Os primeiros têm solidariedade tão natural como respirar, os segundos têm solidariedade condicionada ao interesse próprio, os outros não sabem o que é ser solidário. Na educação, a primeira classe sabe que toda pessoa tem alguma coisa a ensinar, a segunda classe busca conhecer, a terceira esconde o que sabe.

A vaidade para a primeira classe se integra às qualidades por necessidade de harmonia, a segunda classe tem a natural vaidade humana, para a terceira classe a vaidade é máscara da maldade.

Enfim, a primeira classe fica feliz com a felicidade alheia, a segunda aceita ser feliz, a terceira inveja a felicidade dos outros.

Infelizmente, ninguém é sempre passageiro de uma única classe, há mudanças e nem sempre ocasionais.  Pense, leitor, de que classe é a sua viagem e que classe de viagens escolheram os seus conhecidos.

Diógenes da Cunha Lima – Advogado, Professor, Poeta, Escritor, Presidente da Academia Norte-riograndense de Letras    [email protected]  Autor de “Natal – Uma Nova Biografia”.

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