VIDA, VIDA… –
Em meio a um feriado, saímos para almoçar. Os filhos não quiseram ir, portanto, tivemos aquela preguiça de horário, a lentidão da escolha do restaurante, o vagar por todo o cardápio pensando no que me fará feliz com calorias sem excesso. Porém, parece que perdemos o traquejo de sair sem obrigações. Flávio corria em direção a lugar nenhum, com uma pressa para coisa alguma que me chamou atenção.
– Para que isso? Estamos passeando!
Desta forma, ele reduziu as passadas e sua velocidade e pudemos conversar sobre tudo e sobre nada.
Ele me fala do seu coral e da próxima música que gravarão: o que é, o que é. Disse-lhe, após vasculhar meu cérebro por alguns momentos, que não gosto desta música. Aliás, ela me entristece. A letra, sua profundidade, as batidas marcadas, a reflexão. Tenho a nítida sensação que estou fazendo algo errado. Vivendo “errado”. Permitindo o tempo passar “errado”. Sem aproveitar tudo que deveria.
Será que isso realmente existe?
Lembrei de minha infância e dos parquinhos da escola. Gostava muito do balanço, mas era extremamente concorrido. Então, ao encontrar uma amiguinha disponível, íamos à gangorra. Claro que, sendo magra demais e “mole” demais (pura manteiga derretida, chorona e medrosa), acabavam por me colocar de castigo na gangorra e depois de alguns poucos minutos a brincadeira perdia a graça.
Gangorra… era uma prévia da gangorra da vida. Onde queremos correr atrás dos sonhos e pesamos se estes sonhos valem mesmo a pena. Queremos uma casa maior, mas percebemos que, com o tempo, a família aumenta, mas diminui, saindo todos de casa. Para que tantos cômodos? Queremos ganhar mais dinheiro, mas nos sobra menos tempo para gastá-lo… Gangorra… de sonhos, medos, devaneios…
“Há quem fale
Que a vida da gente
É um nada no mundo
É uma gota, é um tempo
Que nem dá um segundo
Há quem fale
Que é um divino
Mistério profundo
É o sopro do criador
Numa atitude repleta de amor”
– Gonzaguinha –
A música não parou de tocar em minha mente durante o almoço. Em meio às gargalhadas por uma bobagem. Em meio a uma mensagem carinhosa que me chegou via WhatsApp. Em meio a uma mordidinha controlada na trufa de chocolate que ele escolheu e eu insisti não querer, para a balança não me denunciar.
E nesta hora, olhando para ele sorrindo com o papel do chocolate na mão, percebi que não há o viver certo ou errado. Há o viver. Sem muita filosofia. Sem muitos questionamentos.
Por isso…
Eu fico com a pureza
Da resposta das crianças
É a vida, é bonita
E é bonita
– Gonzaguinha –
Valeu, Gonzaguinha!
Bárbara Seabra – Cirurgiã-dentista, professora universitária e escritora