VIRAMUNDO 45 –
Maria Josefa das Dores, dona Zefinha, 5 filhos morando na Favela do Mosquito, periferia de Natal na beira da linha do trem, lavadeira atualmente com pouco servido devido a dois desastres: pandemônio da peste chinesa e quarentena imposta pelo governo do estado obrigando as pessoas a ficarem em casa numa espécie de prisão domiciliar sem tornozeleira.
Um inferno. Um beliche de dois lugares, 3 redes e uma cama de casal, cozinha e sala da frente com sofá, uma mesa e uma estante com 1 televisor de 29 polegadas e controle remoto pra assistir novela e programa policial.
Dona Zefinha era de uma tranquilidade que só vendo. Seu Zezinho, o marido, auxiliar de pedreiro, desempregado, ficava na sala vendo televisão e só saia pra ir ao sanitário, no pequeno quintal, a céu aberto e ali se fazia tudo desde tomar banho a necessidades íntimas.
– Dona Zefinha os meninos ajudam a senhora?
– Sim, minha filha. É uma loucura, sem aula e pouca comida vivem brigando.
– O que ajuda um pouco é merenda escolar mas nesses dias não tem porque a escolas estão fechadas.
– Mas dizem que a Prefeitura vai mandar cesta básica pra substituir a merenda. Aqui são 3 que estudam e aí vamo receber 3 cestas?
– Sim. Só não sabemos quando.
Ela ouviu pela TV que o governo federal iria doar auxílio de emergência durante 3 meses. Dona Zefinha e seu Zezinho se inscreveram e foram aprovados. Com o dinheiro compraram comida.
– Graças a Deus esse dinheiro chegou em boa hora. Ja não aguentava mais.
– Vocês não estão usando máscaras com essa pandemônio?
– Essa o que?
– Pandemônia. Surto generalizado dessa doença chinesa que tá matando muita gente.
– Não. Aqui precisa de 7 máscaras e a gente não tem dinheiro pra essa coisa de gente rica.
– Tô vendo que aqui no Mosquito quase ninguém tá usando.
-So uma sirigaita metida a besta que usa.
Nesses dias de quarentena nunca se viu tanta gente na rua sem fazer nada.
Vizinhos que não se viam a muito tempo se reuniam e as fofocas eram o ponto alto das conversas acompanhadas de celulares e reclamações de todo tipo.
Parou um carro trazendo uma troca de roupa.
– Dona Zefinha da pra senhora entregar na sexta-feira?
– Não posso sair pra lavar. No caminho a polícia me prende e leva roupa.
– E agora?
– Espere terminar a danada dessa quarentena que eu lavo.
Pois é com essa ruma de gente dentro de casa a situação ficou insuportável. As brigas começaram e seu Zezinho ameaçou bater em dona Zefinha.
– Painho o senhor ficou doido?
– Não aguento mais ficar aqui sem fazer nada. Vou sair pra juntar latinha de cerveja.
– Aonde? Os buteco tudo fechado. Você vai ser é preso.
– Diabo.
Assim os dias foram passando, intermináveis.
Encontrei dona Zefinha sentada num tamborete na vendinha de seu Chico e perguntei:
– Quem a senhora gostaria de ser nessas horas?
– Madre Tereza de Calcutá.
Jaécio Carlos – Produtor e apresentador dos programas Café da Tarde e Tribuna Livre, para Youtube.
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