VIRAMUNDO 96 –

Francisco Silvestre nasceu em Açu, capital da fruticultura potiguar, e quando jovem foi morar em Mossoró com uma tia, irmã de seu pai.

Sua vida era voltada pros estudos e quase entrou no Educandário São José pra ser padre. A tia Lucila não deixou.

– Esse menino vai desvirtuar os colegas com ideias malucas.

– Vai não Lucila. Deixe o bichinho ir pra lá. Ele pode chegar a ser Arcebispo pela inteligência.

Mas o certo é que Chiquinho não se importou muito isso e ficou no Educandário ate vir pra Faculdade, em Natal .

Deixou muitos amigos em Mossoró e uma antiga namorada em Açu.

Aqui foi estudar filosofia e curtiu muito os ensinamentos de Arquimedes que ele considerava um grande filósofo “grego”, se não era dava pouca importância.

Chiquinho achava que a Grécia foi o berço da civilização e da evolução humana e Olímpia a cidade abençoada.

Lurdinha, a namoradinha de infância, não era ciumenta mas veio morar em Natal e estudar enfermagem.

Foram morar juntos num pensionato no Alecrim, depois alugaram um kit-net em Mirassol quando estudavam na UFRN.

Evitavam a todo custo ter filhos.

– Filho atrapalha e a gente segue o período da menstruação.

– Como assim?

– Cinco dias antes e cinco dias depois a gente pode fazer sexo sem o risco de engravidar.

– E nos outros dias, ficam só na vontade?

– Não, fazemos sexo oral.

– Boa ideia.

Chiquinho era muito namorador e, como Lurdinha não era ciumenta, ele deitava e rolava com as colegas da Faculdade.

Em casa seguia a regra da menstruação, mas na rua não tinha esse controle e aí engravidou Terezinha “sem querer”.

– Vai ter que abortar Terezinha se Lurdinha descobrir eu tô ferrado.

– Nada de aborto. Você é doido?

Eles deram um jeito de Terezinha voltar pra casa dos pais em Mossoró onde teve o filho Arquimedes, nome sugerido por Chiquinho.

Lurdinha nunca ficou sabendo dessa traição e Chiquinho ficou aliviado.

Com o dinheiro que falhava como professor, ajudava Terezinha que mantinha o “segredo” entre eles.

Chiquinho gostava muito de Cordel e organizou um Festival de Cordel na UFRN e tirou vários cantadores e repentistas pra participar do evento.

Passou a ser conhecido como Chiquinho do Cordel e dava aulas de Português improvisando versos em Cordel.

– É mais fácil ensinar assim. Os alunos assimilam melhor as aulas.

Chiquinho do Cordel começou a escrever em jornais e escreveu seu primeiro livro comentando o cordel na vida das pessoas do sertão.

Estreitou relacionamento com Zé Areia; grande poeta Açuense e com Moisés Sesion e a galera de poetas que viviam as noitadas na Ribeira entre cachaças e mulheres.

A vida boemia de Chiquinho do Cordel deu a ele a oportunidade de conhecer grandes personalidades como o potiguar Newton Navarro; poeta e pintor de quadros maravilhosos.

Com Navarro pegou uma carona e viajaram a Paris.

– Newton, como a gente vai viver lá?

– Eu vou ficar pintando e vendendo meus quadros na rua e você vendendo seus cordéis.

Chiquinho improvisou numa baca de revistas colocar cordão estendido entre a barraca e um poste e colocar os livretos de cordel expostos lá, como se faz na feira.

Ele ficava lendo os cordéis em voz alta e chamava a atenção das pessoas que compravam os livrinhos enquanto Newton pintava os quadros na calçada.

O que apuravam dava pra se manter na “cidade luz”.

A experiência foi boa.

Chiquinho conseguiu um contrato para escrever uma vez por semana artigo sobre folclore nordestino no jornal Le Figaro e Newton foi convidado para expor seus quadro na Escola de Belas Artes de Champs Elisée, perto da Torre Eiffel, bem no lugar onde o movimento de pessoas é intenso.

Terezinha convidou Chiquinho e Lurdinha para serem padrinhos de Arquimedes, em Mossoró.
Lurdinha ficou impressionada como Arquimedes era parecido com Chiquinho.

– Ah, as orelhas de abano eram idênticas.

O marido de Terezinha também achou, mas não passou disso.

Por força de contrato com o Le Figaro, Chiquinho foi participar da Semana do Cordel em São Paulo, organizado pela

Associação Nordestina de Cultura e conheceu Madeleine, uma morena filha de francês com brasileira.

Namoro legal por uma semana regado a vinhos e poesia.

Chiquinho trouxe Madeleine pra conhecer Natal.

Ela adorou a Praia de Pipa e lá começou o namoro com um francês, dono de uma pousada e ficou morando com ele.

O novo casal ficou muito amigo de Lurdinha e Chiquinho.

Sempre que iam a Pipa, ficava hospedados na Pousada Le Soleil.

A Embaixada brasileira em Paris promoveu a Semana de Música e Artes do Brasil e Chiquinho levou Lurdinha que adorou Paris mas detestou o trânsito confuso dos carros no centro da cidade.

– Chiquinho, gostei daqui. Topo vir morar aqui?

– Não. Isso aqui no frio ninguém aguenta. Prefiro Natal com as praias de águas mornas o ano inteiro.

Chiquinho do Cordel foi convidado a ser patrono de uma turma de Filosofia da Faculdade com solenidade marcada para o Teatro Carlos Gomes.

Solenidade bastante concorrida com o Teatro lotado em plena sexta feira.
Em dado momento Chiquinho, de roupa preta e do, pegou um charuto e foi se encontrar com os amigos na Tavares de Lira.

Um escândalo.

Deixar a solenidade e ir pra “gandaia”. Imperdoável.

Questionado por antigos ele respondeu:

– Solenidade chata, muito blá, blá, blá…. eu preferi ir para os “braços das raparigas” da Ribeira.

Chiquinho do Cordel era assim mesmo, inteligente, mulherengo, boêmio e grande marido pai de 3 filhos.

– Sou feliz. Lurdinha não é ciumenta e isso é tudo pra mim.

Encontrei Chiquinho com Lurdinha e os 3 filhos tomando vinho em Pipa no Le Soleil de Madeleine e perguntei:

– Quem o inspirou nesse seu modo de vida?

– Câmara Cascudo.

 

 

 

 

 

 

Jaécio Carlos –  Produtor e apresentador dos programas Café da Tarde e Tribuna Livre, para Youtube.

As opiniões emitidas nos artigos/crônicas são de responsabilidade dos colaboradores

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