“VOU-ME EMBORA DO BRASIL” –
Parafraseando o nosso maior bardo modernista, até querendo crer que Manuel Bandeira não tivesse menor inclinação à tese monárquica, quando assentiu que nesse exílio feliz seria o “amigo do rei” e teria as benesses que escolher. Afinal Pasárgada era então a primeira capital do exuberante império persa. Mas aqui eram tempos sempre futuristas de República, com nítido abandono de projetos essenciais do derradeiro e popular imperador, este tido como atuante na busca por um desenvolvimento cultural e moderno. A recordar que D. Pedro II importou cientistas e artistas da França para os diversos projetos nos institutos que principiaram no Império.  Então modernizar era expandir ferrovias, caminho para logística mais eficiente e para produtos competitivos no mercado mundial. Era patente o investimento em ferrovias no “Império do Brazil”, em particular a partir da capital, Rio de Janeiro, e na Província de Pernambuco, promissora região produtora de cana-de-açúcar e algodão.
Na arrevesante República ao que parece o propósito, visto na prática como equivocado, volveu-se para o american way. Avocava-se o pano de fundo democrático americano como um salvo conduto para o alcance do progresso. E num viés temerário tivemos o país imenso cortado por estradas esfumaçados e custosas, logo tornadas rotas rotas-pesadelo. Em cidades do interior os ferros-velhos passaram a compor cenários de pós-guerra, diversos da realidade europeia, que recuperaram estradas e ferrovias a tempo. Abrir estradas pela selva amazônica serviu para descobrir vidas “incômodas”, à medida que surgiam isolados povos indígenas em sua vida natural. E o dilema: o que seria mais importante, prosseguir com a obra mata adentro ou retirar do caminho indígenas, legítimos inquilinos do gigante! Não tardou o sistema que se iniciou na jornada florianista a partir da queda do Império revelou suas incúrias. Primeiros e perplexos anos de confronto de cunho messiânico contra os sertanejos rebelados pelo fanático Conselheiro no esconso baiano de Canudos: 20 mil jagunços nordestinos mortos, mas, enfim, a República saiu-se “vencedora”! com o mesmo sacrifício dos soldados guerreiros, militares, levados para aquela aventura aterradora. Cinco mil militares quedaram no chão ressequido da caatinga do Belo Monte. Euclides denunciou n’Os Sertões a expedição final como massacre.
Até que adveio a era Vargas, sôfrega e duradoura. Não tardou Juscelino seguiu ao pé da letra o modelo do Tio Sam. Passou-se a fabricar carros e caminhões para ocupar estradas, realisticamente, o que tínhamos, em lugar de trilhos ágeis e ecológicos. Na análise de poder aflorou complexo resultado na veia política. Longo enérgico período de base militar acabou tido como realizador do “milagre brasileiro”, aventado ainda como fato histórico de progresso na República! certamente sem houve consenso no conserto de reativas populares e guerrilhas advindo de novos modelos irradiando a orientação socialista. Logo a classe política anunciou a Constituição “cidadã” como solução considerada uma grande panaceia. Aos poucos a consideração da igualdade de pessoas cidadãs passou-se ao sofrimento de imitante guerra civil, que é a violência urbana sem limites que vem assolando cidades pequenas e grandes.
Ano vindouro iremos comemorar os 130 anos da Proclamação “do novo”, proclamado. Alguns historiadores asseguram que o sistema novo surgiu “sem povo”. Seria este o nosso desígnio ilimitado? Há o que comemorar ou será mais uma data a passar em branco, como na comemoração dos 500 anos da descoberta? Vê-se o estro metafórico da busca pela Pasárgada, seja retiro monárquico seja republicano, ou misto, como no verso do poeta. Passado mais de um centenário de experimentos políticos, e resultados confiantes e incertos, muitos brasileiros ainda querem chegar a uma Pasárgada! Hoje não carece de voos com destino ao devaneio americano ou Europeu. Há dias, curiosamente, passou em noticiário televisivo, a história de um brasileiro, garçom e cantor, que achou sua felicidade … na Sibéria!
A rememorar a intrigante obra Brasilien, Ein Land der Zukunft, traduzindo, Brasil, País do Futuro, título de ensaio do autor judeu-austríaco Stefan Zweig, que no final da metade do século XX radicou-se no Brasil, na cidade de Petrópolis. Desse modo, naquele fervilhar da era Vargas, o observador romancista considerou o drama existencial brasileiro. Logo ele que chegou a nossa terra da eterna esperança, fugindo do nazismo.
Luiz SerraProfessor e escritor
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